Negócios Comunitários: a importância de fortalecer associações de agricultura familiar

Sumário

Quero começar este texto te fazendo um convite e uma provocação: pare por um instante e imagine uma pessoa empreendedora. Qual é a primeira imagem que vem à sua mente? Para a grande maioria, falar em empreendedorismo é sinônimo de terno, gravata e prédios altos em grandes centros urbanos. Ainda que muitos empreendedores e empreendedoras se encaixem nesta figura, a economia brasileira não se resume ao ambiente das grandes metrópoles. 

Pelo contrário, no decorrer dos últimos anos vimos um crescente reconhecimento da importância do meio rural, e da preservação e valorização dos nossos ecossistemas naturais para o desenvolvimento sustentável. Podemos citar como exemplos as iniciativas relacionadas à bioeconomia, investimentos em projetos de economia regenerativa e o aumento do apoio a projetos e organizações que promovem o uso sustentável dos recursos dos diferentes biomas brasileiros. 

Além disso, a Conexsus, Idesam, PPBio, Natura, ICV, Sitawi são alguns exemplos de organizações que vêm atuando neste segmento e alcançando resultados relevantes para a economia. 

Na Semente Negócios executamos projetos de modelagem e aceleração de negócios comunitários em diferentes regiões do país, sempre em parceria com atores locais e organizações especializadas. Junto à Conexsus (Instituto Conexões Sustentáveis), desenvolvemos uma metodologia específica para mapear os desafios enfrentados pelos negócios comunitários. Ao longo dos últimos três anos, trabalhamos junto com mais de cem negócios comunitários de impacto. Nessa jornada, percorremos as cinco regiões do Brasil e trocamos com lideranças que estão empreendendo negócios de impacto nas mais diversas cadeias de valor: cacau, café, açaí e muitos outros produtos do manejo florestal e da agricultura familiar. 

Mas por que é importante apoiar o desenvolvimento de negócios comunitários no Brasil?

foto de um agricultor segurando grãos de café nas mãos. a imagem está focando apenas nas mãos e nos grãos. imagem ilustrativa do conteúdo negócios comunitários

Estudo recente realizado pela Conexsus, com base nos dados do Censo Agropecuário, apontou que há mais de 30 mil empreendimentos comunitários no Brasil, gerando trabalho e renda para cerca de 15 milhões de pessoas. Entre negócios da agricultura familiar e do extrativismo vegetal não madeireiro, são quase 600 milhões de hectares de terras aptas para produção sustentável e geração de valor compartilhado, movimentando cerca de R$80 bilhões de reais ao ano.

Muitos estão organizados em associações e cooperativas de produtores, responsáveis pela produção de alimentos saudáveis e exercendo um papel fundamental para a sustentabilidade dos ecossistemas e para o desenvolvimento socioeconômico dos territórios nos quais estão inseridos. Ainda assim, a oferta de ferramentas de gestão ágil, desenvolvimento de negócios, empreendedorismo e inovação são escassas para este público. 

A modelagem de negócios, neste contexto, se apresenta como um processo e uma “caixa de ferramentas” extremamente útil, capaz de auxiliar as lideranças comunitárias a melhorar a gestão dos seus negócios, fortalecer a governança de suas organizações, agregar mais valor à sua produção e ampliar e diversificar o acesso a mercados. 

O processo de modelagem de negócios e as especificidades das organizações comunitárias

Neste processo, é muito importante levar em consideração e respeitar as peculiaridades e características específicas dos empreendimentos de base comunitária. Começando pelos aspectos sociais e demográficos, dado que em sua maioria os gestores e gestoras de empreendimentos comunitários apresentam perfis distintos dos empreendedores de startups, mas não apenas.

O formato de governança das organizações comunitárias também costuma ser distinto, seguindo as bases do associativismo e do cooperativismo a fim de envolver as famílias associadas não apenas no processo produtivo e na oferta de mercadorias, mas em diversas etapas do planejamento estratégico e execução dos planos de trabalho.

Por fim, é importante pontuar que diferente de uma startup, ou seja, uma organização temporária formada para buscar um modelo de negócio escalável, os negócios comunitários têm a sua gênese na construção de uma força coletiva de unidades produtoras que compartilham recursos de um mesmo território. A busca por um modelo de negócio sustentável (e não necessariamente escalável) constitui aqui o meio para outros objetivos finais, que irão variar dependendo do contexto, nível de maturidade e da visão de futuro da organização.

Por isso, antes de iniciar um processo de modelagem junto a negócios comunitários, é importante entender o contexto e as particularidades específicas, sociais, econômicas e ambientais daquela organização, da região e das cadeias produtivas nas quais ela está inserida. Da mesma forma, o desenvolvimento e uso de ferramentas adaptadas e pensadas especificamente para atender aos desafios dos negócios comunitários é essencial.

O Canvas dos Negócios Comunitários: buscando modelos de negócio replicáveis

close na mão de uma pessoa segurando um punhado de terra. imagem ilustrativa do conteúdo sobre modelagem de negócios comunitários

Com isso em mente, desenvolvemos juntamente com a Conexsus uma nova ferramenta de modelagem de negócios comunitários, olhando especificamente para as particularidades das associações e cooperativas.

O Canvas dos Negócios Comunitários leva em consideração os diferentes componentes que constituem uma organização comunitária, incluindo no seu modelo de negócio a participação ativa e a necessidade de entrega de valor para os cooperados e associados. Ele prevê também a identificação da cadeia produtiva na qual está inserido, e atrela seu preenchimento ao estabelecimento de objetivos comuns e definição de prioridades de impacto positivo que se está buscando. Os produtos ofertados pelo negócio também ganham relevância, entendendo que em muitos casos estes já estão definidos a priori pelos condicionantes ambientais e produtivos da região. 

O Canvas incentiva que as lideranças de negócios comunitários, empreendedores e empreendedoras, busquem o contato com seus clientes, público-alvo e demais beneficiários, a fim de realizar testes de mercado e definir os canais e mecanismos mais adequados para realizar a entrega e captura de valor para suas organizações. É uma ferramenta de interação com o mercado, proporcionando ao time uma visão simplificada e de construção conjunta sobre o seu modelo de negócio.

O Canvas de Negócios Comunitários pode ser utilizado tanto em seu formato impresso quanto na versão online, em sessões individuais com uma única organização ou na facilitação de processos coletivos.

Quer conhecer o Canvas de Negócios Comunitários e aplicá-lo na modelagem da sua organização? Clique aqui para fazer o download de um exemplo preenchido.

A Modelagem de Negócios Comunitários na prática: caso do projeto Conexão Semiárido

Em outubro de 2020, realizamos uma rodada de oficinas de modelagem de negócio com agricultores familiares do Sertão do São Francisco, na Bahia, e da Chapada do Vale do Rio Itaim, no Piauí. Em formato de workshop, a atividade foi parte do projeto Conexão Semiárido, uma realização da Conexsus, do projeto Adaptando Conhecimento para a Agricultura Sustentável e o Acesso a Mercados (AKSAAM/UFV), da Fundação Arthur Bernardes (FUNARBE), da Universidade Federal de Viçosa (UFV) e do Instituto de Políticas Públicas e Desenvolvimento Sustentável (IPPDS), com apoio do Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola (FIDA).

Além de disponibilizar conhecimento sobre modelagem de negócios para os participantes, a oficina também buscou proporcionar momentos de trocas significativas e de aprendizagem coletiva entre os participantes das oficinas, permitindo uma construção dos saberes a partir do compartilhamento de experiências próprias e tratando de temas como: mercado e posicionamento, canais e entrega de valor, entradas e receitas, entre outros. Tanto o método quanto o material didático foram adequados para o formato remoto – devido à pandemia da Covid-19, gerando uma tecnologia social inovadora que tem alto potencial de replicação em todo o Brasil.

Segundo André Ramos, consultor da Conexsus, “o objetivo das oficinas é estimular os negócios comunitários a revisarem seus modelos de negócio, identificando possíveis ações estratégicas que possam ser executadas ao longo do projeto para aumentar o potencial econômico e de geração de impacto socioambiental positivo desses negócios”.

Ao todo 19 empreendimentos comunitários participam da iniciativa, sendo mais da metade liderada por mulheres e alcançando indiretamente aproximadamente 2 mil produtores da agricultura familiar.

Com duração de 15 meses, o projeto Conexão Semiárido se concentra em cooperativas apoiadas pelos projetos FIDA no Nordeste, e conta com a Central da Caatinga (Central de Comercialização das Cooperativas da Caatinga) e a Coovita (Cooperativa de Produtores e Produtoras da Chapada do Vale do Rio Itaim) como parceiros locais.

Quer saber mais sobre ferramentas e metodologias para modelagem de negócios comunitários e de impacto? Entre em contato conosco pelo formulário ou pelo email [email protected]

luciana
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